quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O Silêncio



Quando digo que VOU para dentro, não significa que haja alguma distância entre mim e a minha alma. Bem pelo contrário, é o vazio; sem obstáculos, sem frio nem calor, um espaço sem coordenadas, num tempo circular onde o inicio toca o fim. É esse silêncio que me define, e é nele que me encontro.



O silêncio é um vento que sopra nas esquinas esquecidas e húmidas da ausência da consciência.
É um vento que levanta a poeira dos tempos, acumulada em camadas endurecidas de medos e culpas, como uma lufada que refresca a memória das vontades perdidas no emaranhado de ideias rebuscadas de fantasias e vazias de verdade.
É a brisa que nos toca ao de leve arrepiando-nos com ternura e confundida com redemoinhos que nos arrancam desejos.
Ou a tempestade que adivinhamos, mas que ignoramos, por temermos que nos varre o terreno das nossas crenças, aquele onde construímos a realidade com janelas viradas a poente. As portas trancam-se mas os telhados levantam com a força do destino que tem os seus momentos agendados.
Intuições adiadas que não nos atrevemos a reconhecer, apesar de choverem sinais de estrelas todos os dias, chamando o nosso nome, para que estejamos presentes nos encontros com o infinito.
O silêncio desabrigado de nós transforma-se em tornados de fúria demolindo as paredes da passividade, e os muros que resguardam as fragilidades que nos pertencem.
O silêncio é a música que dançamos com o EU que não conhecemos, mas ansiamos, quando fechamos as pálpebras e dormimos a mente.
O silêncio é âmbar. A cor do ouro que protege o tesouro aprisionado pelas horas da história de que é feita a nossa dimensão.
É precioso e belo, é duro e inquebrável.
É ar desperdiçado em respirações inconscientes, inalado em porções menores, por não abrirmos o peito de quem somos, olhando de frente o caminho traçado pela vontade intangível no espaço-tempo deste céu.
O corpo é cego de silêncios, apenas visíveis na contemplação de um horizonte que não é o fim do mundo, por olhos que sem retina, guardam na alma as imagens do divino.
O silêncio é o vento que sopra sem frio, tocando a nossa superfície, penetrando-nos os poros e invadindo em nós, a caverna das únicas certezas.
O silêncio é o suspiro de vazios que liberta o querer incontido da inspiração que acompanha o canto do Universo.



quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O menino que queria o Sol



Era uma vez um menino que passava o dia a olhar o céu. Admirava o Sol que lhe aquecia a vida das tristezas, iluminando os recantos escuros do seu mundo.
Queria tanto que o Sol fosse dele, mas tanto, que a Mãe-Terra lhe ouvia as preces.
E um dia, quando a ansiedade tomou conta do coração do menino ao ponto dele não conseguir olhar as flores, escutar os pássaros e pintar as cores, Ela abordou-o:
- Menino, sabias que o Sol é a minha Alma?
O menino assustado pôs-se à escuta. A voz era doce e ouvia-a com o coração, numa sinfonia celestial. Olhou à volta para descobrir quem lhe falava. A Terra continuou:
- Sou a Mãe-Terra, aquela que te alimenta e que sustenta a tua realidade, a realidade que tu escolheste experimentar.
O menino abriu os olhos de espanto. As perguntas surgiram: Mas afinal, porque haveria ele de escolher viver triste? Sem poder alcançar o Sol? Não se lembrava de ter escolhido tal sina.
O seu coração palpitava aceleradamente. Queria tanto o Sol! Queria tanto poder passear com um Sol atado por um cordel ao seu pulso! De certeza que todos os outros meninos olhariam para ele e que a luz nunca mais se apagaria!
A Mãe-Terra contou-lhe então um segredo:
- Não percebes, menino, que tens um Sol? E que nem precisas de o segurar porque ele está dentro de ti? Porque não permites que ele nasça, como eu faço em cada Aurora com o meu Sol, partilhando-o contigo e com todos os meus filhos?
O menino nem queria acreditar! Um Sol dentro dele? Isso seria um tesouro maravilhoso! Uma enorme bênção! Um milagre. Mas se há um Sol dentro dele, como é que ele ainda não O percebeu?
A Mãe-Terra abalou divertida, o chão por baixo do menino. E rendida à sua inocência revelou-lhe:
-Tu e todos os meus filhos são abençoados. Alguns enterraram tão fundo o tesouro que não conseguem encontrá-lo. Mas outros, lembraram que tinham um Sol e escavaram o fundo das suas almas. Estes foram alcançados por uma Luz que lhes ilumina a vida. Tu podes ser como eles e partilhar também o teu Sol. Atrairás todos os meninos que te olharem e iluminarás mesmo sem que eles o tenham pedido.
Escutou-se então um silêncio e o menino sentiu o coração abrandar. Percebeu que a Mãe-Terra tinha terminado o diálogo. Desejou abraçá-la, grato pelo brilho da sua mensagem. E falou-lhe assim:
- Vou cuidar de ti Mãe-Terra para que possas continuar a falar ao coração dos teus filhos. E vou lembrar, olhando o teu Sol todos os dias, que o meu Sol nasce com o meu sorriso.
Nesta inspiração o menino percebeu que transportava a Luz, e que ela era infinita. Não precisaria de um cordel para a segurar!
Na emoção do despertar de mais um filho para o seu Sol Interior, a Terra sacudiu-se num terramoto de amor abrindo fendas de esperança para que todos a pudessem finalmente ouvir.